Violência doméstica: epidemia brasileira

“Mulheres serviram todos estes

séculos como espelhos possuindo

o poder de refletir a figura do

homem duas vezes maior que

seu tamanho natural”.

Virginia Woolf

 

mulheres_russia

O marco inicial da luta das mulheres foi durante a Revolução Russa, em 1917, em que buscou-se a redução das desigualdades Foto: Google

É muito comum no Dia Internacional da Mulher, vermos as citações da greve das mulheres operárias de Nova Iorque – que lutavam por equiparação salarial – como o símbolo das mulheres.  Sem dúvida, é símbolo e sofrido. Contudo, uma retrospectiva mais amiudada sobre o histórico feminino nos mostra que tal simbologia se deu em face à quantidade (130) de mortes de mulheres da praça da greve, o que nos trás a certeza do apego humano à simbologia da morte e da tragédia.

Naquela época (idos de 1857), as operárias cumpriam jornada de 16h/dia de trabalho recebendo o valor equivalente a menos de 1/3 do salário pago aos homens. Vale ressaltar: estou me referindo a uma realidade que ocorreu há 156 anos. A pergunta que não quer calar é: fizeram o necessário para a grande mudança?

Por mais difícil que seja para os mais jovens acreditar, o fato é que, há menos de 100 anos, a maioria das mulheres não trabalhava fora de casa, não podia estudar, não tinha acesso aos métodos contraceptivos (somente na década de 1960 foi criada a pílula anticoncepcional), não podia se divorciar (ruim com ele, pior sem ele) e nem mesmo votar.

Números e referências

A violência doméstica, que antes era considerada um assunto familiar (“em briga de marido e mulher, quem é de fora não mete a colher”), hoje conta com legislação específica em 2/3 dos países. A variedade de violências antes cometidas era considerada somente bravatas, mas hoje estão tipificadas como crime no Código Penal Brasileiro.

No Brasil, grande passo foi dado com a aprovação da Lei Maria da Penha. Contudo, para que esta lei de proteção à mulher tenha maior efetividade é preciso que os gestores instalem Delegacias da Mulher nos municípios, Centros de Referência para as mulheres com atendimento multidisciplinar, ou mesmo Casas de Passagem – para abrigar a mulher espancada que não pode permanecer no lar sob a pena de ser assassinada por um homem violento.

No Brasil a violência contra a mulher é uma epidemia. Este processo de conscientização e respeito à vida é lento e sofrido de forma que a Lei Maria da Penha por si só não se tornou inócua graças às guerreiras brasileiras que doam sua vida a esta causa. Graças também ao pequeno número de legisladoras brasileiras que ‘não deixam a peteca cair’.

Maria-da-Penha

A cearense Maria da Penha lutou durante anos contra a violência doméstica e, hoje, é um exemplo para todas as mulheres.

Hoje as mulheres ocupam cargos antes exclusivos para homens – inclusive de lideranças políticas -, embora, neste caso, tenham menor representatividade (em média, 18,4% no Legislativo). Por outro lado, as mulheres ainda têm menos acesso à educação – dois entre cada três analfabetos são do sexo feminino.

Ainda hoje, nos defrontamos com um universo em que a imagem do “homem machista é a extensão de poder”. Não há exagero em dizer que a violência verbal ou comportamental comete pequenos assassinatos na vida das mulheres. Frases como “- Se eu te largar ninguém vai te querer”, “- Quem come do meu feijão prova do meu cinturão”, “- Você não presta mais nem para limpar o chão que eu piso”, infelizmente, ainda fazem parte do cotidiano de muitas mulheres.

Estamos falando aqui de comportamentos masculinos que comprometem a saúde da alma feminina, que matam lentamente sem deixar rastros e não levam ninguém para cadeia. A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou que “sete, entre cada grupo de 10 mulheres, fatalmente sofrerão algum tipo de violência ao longo de sua vida”. Não se trata mais de leis, mas de práticas e de real coerção destas práticas.

Caminhos para trilhar

Para que essa dura realidade mude, é preciso dar treinamento adequado aos servidores que realizam o atendimento das vítimas no balcão de atendimento. É preciso punição ao servidor que se serve de frases como “- Você de novo aqui Maria? Eu quis prender teu marido e você protestou, você já acostumou a apanhar”. É preciso denunciar este tipo de atendente. É preciso punir o médico que diz à parturiente do hospital público “- Deixa de gritar Maria, quantos filhos você tem? Dois? Então não doeu, porque você voltou”. Estes ‘donos da verdade’ precisam compreender que papéis como este não são mais aceitos na sociedade.

About Nubia Dutra

Nubia Dutra é psicóloga, psicoterapeuta, advogada criminalista, especialista em direito civil e processual civil, especializanda em perícia criminal, poeta e estudante de teologia. Nasceu sob o signo de sagitário, tem um temperamento alegre, é espirituosa e adora animais.

One response to “Violência doméstica: epidemia brasileira

  1. Pingback: Núbia Dutra realiza palestras em homenagem ao Dia Internacional das Mulheres em Paço do Lumiar | Núbia Dutra

Leave a comment